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O que são os gastos de financiamento líquidos?

Descubra o que são os gastos de financiamento líquidos, como calculá-los e qual o seu impacto na gestão fiscal e financeira das empresas.

Homem a intervir numa reunião de equipa, sentado à mesa.

Os gastos de financiamento líquidos são um conceito fundamental no âmbito da fiscalidade empresarial em Portugal. Especialmente no contexto do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC). 

  • O conceito de ‘gastos de financiamento líquidos’ está previsto no artigo 67.º do Código do IRC, que estabelece os princípios e limites relativos à dedutibilidade fiscal dos gastos de financiamento incorridos pelas empresas.
  • Conheça os principais regulamentos associados, bem como a sua importância na gestão financeira das empresas e o enquadramento legal previsto no Código do IRC.

Regra geral, os gastos de financiamento referem-se a encargos suportados pelas empresas decorrentes da obtenção de empréstimos necessários para a prossecução das suas actividades empresariais.

Estes incluem juros pagos sobre empréstimos bancários, comissões relacionadas com financiamentos, custos associados a instrumentos financeiros, entre outros. 

COMPARTILHA! Sabe o que são os gastos de financiamento líquidos? Assegure-se que conhece os seus limites e evite surpresas a nível da carga fiscal que irá suportar.

CONTEÚDO DO POST

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Definição de gastos de financiamento líquidos

O conceito de ‘gastos de financiamento líquidos’ surge, então, como um mecanismo que visa equilibrar o tratamento fiscal destes gastos, evitando abusos por parte das empresas e promovendo a sustentabilidade financeira.

Por outras palavras, trata-se de uma limitação, introduzida pelo legislador, à dedutibilidade fiscal dos gastos de financiamento incorridos pelas empresas de modo a evitar que as mesmas paguem menos impostos através de gastos de financiamento excessivos.

Para determinar-os, deduzem-se aos gastos de financiamento os rendimentos obtidos pelas empresas também a título de financiamento. Tais como os juros recebidos por empréstimos concedidos ou outros rendimentos financeiros.

Assim, a fórmula para calcular os gastos de financiamento líquidos é:

Gastos de financiamento líquidos = gastos de financiamento – rendimentos de financiamento

Por que razão existe os gastos de financiamento líquidos?

O artigo 67.º do Código do IRC transpõe para o ordenamento jurídico português a Diretiva Europeia relativa a regras comuns de limitação da dedução de gastos de financiamento, integrando as normas de combate à elisão fiscal. 

Esta disposição legal impõe limites à dedução dos gastos de financiamento, com o objetivo de evitar que as empresas façam um uso abusivo de financiamentos de terceiros (e.g., bancos) para reduzir a sua carga fiscal.

Isto porque, na esfera das empresas, os gastos de financiamento (i.e., juros, comissões, etc.) são considerados dedutíveis para efeitos fiscais. Significando isto que quanto mais juros as empresas pagarem, menos impostos pagarão sobre os rendimentos que obtiverem

De acordo com o artigo 67.º, a dedução dos gastos de financiamento líquidos está limitada a 30 % do resultado antes de depreciações, amortizações, gastos de financiamento líquidos e impostos (EBITDA fiscal). Existe, no entanto, um limite mínimo de 1.000.000 de euros. O que significa que, independentemente do EBITDA fiscal, os primeiros 1.000.000 de euros de gastos de financiamento líquidos são sempre dedutíveis para efeitos fiscais.

Importância dos gastos de financiamento líquidos na gestão financeira das empresas

A limitação à dedução fiscal de gastos de financiamento líquidos tem implicações directas na forma como as empresas estruturam o seu financiamento.

Com efeito, a imposição deste limite incentiva as empresas a ponderar melhor o equilíbrio entre financiamento por capitais próprios. Por exemplo, recurso a meios financeiros dos sócios das empresas, que permitem às empresas financiarem-se de forma mais saudável. E por capitais alheios

Por outras palavras, um elevado recurso a endividamento pode traduzir-se numa menor eficiência fiscal devido à limitação da dedução de juros.

Esta restrição tem também o objectivo de promover a estabilidade financeira das empresas, desencorajando o endividamento excessivo e contribuindo para um sistema fiscal mais equilibrado e justo.

Exemplo prático 1

Consideremos uma empresa (ABC) que, no ano de 2024, apresentou um EBITDA fiscal de 5.000.000 euros e gastos de financiamento líquidos no valor de 2.500.000 euros. 

Se atendermos ao limite de 30 %, a dedução máxima permitida seria de:

30 % x 5.000.000 euros = 1.500.000 euros.

Assim, significa isto que, em 2024, apesar de ter incorrido em gastos de financiamento líquidos no valor de 2.500.000 euros, a empresa ABC apenas poderia deduzir 1.500.000 euros, sendo os restantes 1.000.000 euros não dedutíveis. 

Exemplo prático 2

Imaginemos agora outra empresa (XYZ) que, no ano de 2025, irá apresentar um EBITDA fiscal de 500.000 euros e irá incorrer em gastos de financiamento líquidos no valor de 900.000 euros.

Se atendêssemos ao limite de 30 %, a dedução máxima permitida seria de:

30 % x 500.000 euros = 150.000 euros.

No entanto, como vimos acima, o artigo 67.º do Código do IRC prevê um limite mínimo de 1.000.000 euros independentemente do EBITDA fiscal apurado em cada ano.

Assim, seria mais vantajoso à empresa XYZ utilizar o limite de 1.000.000 euros, apesar de no ano em questão prever apurar um EBITDA fiscal reduzido.

É fundamental que as empresas adoptem boas práticas de contabilidade e mantenham registos detalhados, por forma a evitar que, em caso de inspeção fiscal, existam problemas.

Excepções e outras regras especiais previstas na lei

O artigo 67.º contempla algumas excepções às regras gerais de dedução.

Com efeito, empresas que integrem grupos consolidados fiscalmente podem ter um tratamento diferenciado. Isto, permite uma gestão mais eficiente dos gastos de financiamento dentro do grupo. 

Além disso, certos sectores de actividade, nomeadamente, as entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal e da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, e às sucursais em Portugal de instituições de crédito e outras instituições financeiras ou empresas de seguros. Não se encontram sujeitos a estas limitações, precisamente devido às particularidades associadas à actividade que desenvolvem.

Consequências do incumprimento

O incumprimento das normas relativas à dedução dos gastos de financiamento líquidos pode resultar em coimas e outras penalizações fiscais tais como juros compensatórios.

Além disso, a Autoridade Tributária e Aduaneira pode proceder a correcções fiscais, aumentando o lucro tributável das empresas e, consequentemente, o imposto final a pagar.