Crescimento de Negócio e Clientes

A informação financeira e fiscal desmaterializada: 4 questões fundamentais

A propósito do período de apuramento do resultado tributável e assim do imposto a pagar, ou a recuperar, através da entrega de declaração anual de rendimentos das sociedades (Modelo 22) e da necessária elaboração da informação contabilística, fiscal e estatística anual, através da IES (Informação Empresarial Simplificada) relativo ao exercício económico de 2021, a par da necessária comunicação, cada vez mais em tempo real, da informação económica e financeira das empresas, é importante refletir sobre novas formas de interação entre os profissionais e as diversas entidades, quer seja através de empresas de contabilidade, na prática individual, ou integrados nas próprias organizações.

A desmaterialização do suporte das transações internas e externas é um caminho incontornável, com a vantagem de se obterem ganhos de eficiência nos processos administrativos, mas também pela necessidade de disponibilização de informação tempestiva, útil e de qualidade que permita aos decisores a antecipação dos efeitos económicos e financeiros das operações comerciais e seus efeitos fiscais.

Para a substituição do elemento físico, o papel, é necessário assegurar 4 condições fundamentais, que devem ser desenvolvidas em articulação, sob o risco de serem originadas entropias que podem comprometer o sucesso desejado:

  1. Investimento em tecnologia;
  2. Novos processos e procedimentos de trabalho;
  3. Novos conhecimentos e competências;
  4. Alterações legislativas (elementos de prova).

Investimento em tecnologia

A desmaterialização das operações implica a existência de tecnologia apropriada, quer em termos de hardware, quer com software apropriado, e de formas de comunicação, cada vez mais “on-line”, que permitam assegurar a eficiência dos processos, mas também os princípios básicos da informação:  a confidencialidade (uma vez que a informação só deverá estar acessível a pessoas autorizadas), a integridade (ao garantir que a informação mantém sua origem e não pode ser alterada), a disponibilidade (ao garantir que os dados das organizações precisam estar seguros e disponíveis para serem usados a qualquer momento pelos utilizadores autorizados), e a autenticidade (que permite identificar e registar o utilizador que produziu ou modificou a informação).

Os recentes casos de ataques informáticos, tornados públicos, vêm reforçar a importância de se assegurarem sistemas de segurança (cibersegurança) in Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, https://ciberduvidas.iscteiul.pt/consultorio/perguntas/ciber/1268 [consultado em 23-06-2022]

apropriados para impedir o acesso indevidos aos dados ou até a sua destruição, com riscos económicos, mas também de ordem legal (Regulamento Geral de Proteção de Dados – RGPD – Regulamento (UE) 2016/679).

Este investimento implica a necessária disponibilidade de recursos financeiros, mas também de escala no volume de negócios, que permita a recuperação do capital investido. Para que este tipo de investimento seja possível em pequenas empresas de contabilidade, ou pelos profissionais em prática individual, será necessária outra forma de cooperação e união de esforços. Torna-se assim evidente uma previsível concentração de atividades.

Novos processos e procedimentos de trabalho

A evolução tecnológica obriga a uma reformulação dos procedimentos de trabalho, e a introdução de novos processos, baseados em dados e sistemas que comunicam e interagem sem suporte de papel. Serão necessários o desenho e o desenvolvimento de sistemas, bem como a parametrizações das transações para o tratamento dos dados que, para além dos tradicionais conhecimentos técnicos, exigem novas competências no uso destes tipos de sistemas de informação. Será, por isso, um regresso ao tema “organização, sistemas e métodos (OSM)”, considerada uma área clássica da administração e análise e desenvolvimento de sistemas que lida com um conjunto de técnicas que tem como objetivo principal aperfeiçoar o funcionamento das organizações, que foi sendo abandona pelas empresas, com o argumento da “burocracia”.

Em vez de dados impressos em papel, em pasta de arquivo, temos de saber usar, organizar e processar bases de dados, e arquivos eletrónicos, com vista ao necessário aumento da produção com o mesmo tempo de trabalho e uma melhor qualidade do serviço do ponto de vista técnico, para se obter progressos em indicadores críticos de desempenho como custos, qualidade, serviços e agilidade.

Novos conhecimentos e competências

Com a introdução de novos sistemas, novos processos e procedimentos, é inevitável a aquisição de novos conhecimentos e competências por parte dos profissionais. O atual sistema de normalização contabilística (SNC) já exige que os profissionais se aproximem mais dos negócios e das atividades económicas para poderem compreender os factos económicos e financeiros e recolherem a informação que será necessária para a elaboração da informação financeira e não financeira. Embora a parametrização das operações permita eliminar tempo gasto em operações repetitivas, será indispensável a compreensão dos negócios e dos instrumentos legais para se poderem refletir as transações nas demonstrações financeiras. O julgamento profissional é insubstituível e não parametrizável.

É também uma oportunidade para os profissionais desenvolveram as suas competências na área das “soft-skills”, cada vez mais exigidas nas diversas profissões como o poder de decisão, ao saber ponderar de forma racional e cuidadosa, a inteligência emocional, para evitar ruídos na comunicação, saber desviar dos conflitos e ter diálogos mais saudáveis, a negociação, ao saber comunicar apropriadamente para cada tipo de interlocutor e e entender as suas expectativas, e o pensamento crítico, que consiste na habilidade de pensar com clareza e racionalidade, de maneira independente, e não aceitar explicações simplistas.

Alterações legislativas

A substituição do papel por transações em suporte eletrónico vem trazer novos desafios na obtenção da prova para os casos de uma disputa legal, fiscal ou não. É necessário, por isso, que a legislação acompanhe estas novas formas de suportar as operações comerciais, com vista a não prejudicar o elemento indispensável numa disputa legal: a prova.

Se bem que o formato eletrónico também já seja considerado elemento de prova, por exemplo um e-mail, é necessário que seja aceite, de forma definitiva, que uma impressão não tem que ser feita, necessariamente, em papel. Uma impressão eletrónica também terá de ser um elemento de prova aceite numa disputa legal, ou como elemento válido para suportar uma transação para efeitos fiscais, para além da faturação eletrónica.

Se estas condições são forem asseguradas em simultâneo, em vez da pretendida evolução caminhamos para o caos.